A trilha para o desconhecido

on sábado, 8 de maio de 2010
Presa. Limitada. Sem escolhas. Era assim que Annabeth se sentia. Era uma garota muito esperta, apaixonada pelo conhecimento, dias ensolarados e algodão doce. Tinha apenas onze anos e uma baixa estatura para sua idade. Segundo ela, possuía uma vida relativamente feliz quando morava na pacata cidade de Aqui-tem-muito-mato. Porém, ao completar dez anos - seu último aniversário feliz, segundo ela -, recebeu a infeliz notícia de que seu pai, um jornalista amante de queijos e vinhos, seria transferido para uma cidade enorme cheia de prédios e fábricas poluentes. Mas ela também era muito compreensível e entendeu quando seus pais vieram conversar com ela e dizer que seria a melhor coisa a fazer, pois seu pai ganharia mais e seria bom para criar o bebê - já que sua mãe estava grávida.
Apesar de tudo, Annabeth sentiu-se muito, muito triste por ter que deixar a cidade em que tanto depositou amor e carinho em todas as coisas que fazia. Desde que nascera ela morava em Aqui-tem-muito-mato. Não havia nada mais prazeroso para ela do que visitar o parque em um dia de sol, comer algodão doce e subir em algumas árvores. Muitas vezes fazia essas coisas sozinha, pois nunca foi uma garota sociável. Quando estava acompanhada, estava junto a suas primas mais novas que mal entendiam as brincadeiras inventadas pela mirabolante cabecinha de Annabeth.
Quando mudou-se para a cidade grande, Annabeth sentiu-se tremendamente fora de seu lugar. Como uma vespa sentiria-se em um território de cigarras; ou como um leão sentiria estando entre zebras. Tudo era muito grande, muito complexo. Ao invés de ir de bicicleta para a escola, aproveitando a brisa da manhã e o sorriso gratificante dos vizinhos conhecidos da sua cidade natal, Annabeth agora tinha de sair muito cedo de casa para poder chegar a tempo em sua escola nova, e ainda tinha de pegar um ônibus lotado. A nova cidade não tinha a mesma brisa da manhã que a cidade natal; e muito menos o sorriso gratificante dos vizinhos. O máximo que ela conseguia era um sorriso falso e amarelo do porteiro do seu prédio.
Com dois meses morando na cidade grande, Annabeth achava tudo insuportável. Seus pais só saíam com ela e seu pequeno irmão nos finais de semana, e na maioria das vezes ao shopping ou algum outro lugar próprio da cidade grande. E assim seguiu-se por um longo período. Annabeth queria ir à um parque arborizado, comer algodão doce e sentir os raios de sol fulgurantes em seu rosto. Ela queria tudo o que Aqui-tem-muito-mato possuía. Ela queria voltar à sua cidade natal.
Então Annabeth planejou uma coisa que nunca passaria por sua cabeça se ela não se encontrasse na situação em que estava - absurdamente entediada e presa em uma cidade cinza, sem graça e infeliz. Ela planejou fazer uma visita à Aqui-tem-muito-mato, mesmo sem o consentimento dos pais. Ela sabia que isso não era algo certo de se fazer, mas às vezes as regras não podem ser seguidas à risca se você quer muito algo que não se enquadra nas regras. Às vezes é necessário quebrá-las e ser feliz.
Ao sair da escola ela pegou um ônibus que ia direto para a rodoviária da cidade - a qual ela não gostou muito, pois haviam pessoas muito estranhas por perto. Em seguida pegou um ônibus para Aqui-tem-muito-mato. Foi fácil despistar a moça e comprar o ticket, e mais fácil ainda enganar o motorista dizendo que estava acompanhada, pois Annabeth era muito esperta. E após uma hora e alguns minutos ela encontrava-se em frente à enorme praça arborizada que ela tanto sonhara. A barraquinha de algodão doce continuava lá; o ar puro e relaxante também. E Annabeth divertiu-se muito naquela tarde, esquecendo de todas as preocupações que a aflingiam.
Enquanto degustava um delicioso algodão doce e balançava-se em um balanço de madeira, Annabeth observava a mata que sempre estivera próxima ao parque. Desde pequena ela visitava aquele lugar mas nunca havia notado realmente a extensidade que aquela mata poderia ter, os mistérios que ali poderiam conter. Confesso à vocês que Annabeth estava um pouco debilitada por ficar tanto tempo longe da natureza, e talvez por isso tenha feito aquela escolha naquele momento, pois ali Annabeth decidiu que seria interessante explorar a mata próxima ao parque. Tudo o que ela tinha que fazer era atravessar uma pequena trilha que levava para dentro da mata, e a partir dali só haviam árvores e mais árvores. Annabeth pôs-se a pensar se não seria um erro prosseguir com tal aventura, mas ao lembrar o que a aguardava quando voltasse para o mundo real, não pensou duas vezes e seguiu na trilha, que a levaria para só Deus sabe onde; que a levaria para o desconhecido.


Créditos da ilustração: Nath Araújo (@Natxiii)

0 comentários:

Postar um comentário